quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Pílula Vermelha ou Azul?


[na figura: pílulas vermelha e azul]



Na trilogia cinematográfica Matrix (1999), em seu primeiro filme, o protagonista é apresentado a um par de pílulas: uma azul e a outra, vermelha. A pílula azul lhe permitiria continuar vivendo a sua vida normalmente, como um sonho. A vermelha serviria para lhe mostrar a real natureza da Matrix. E o que é a Matrix? Assistam o filme. Basta o primeiro da série. (E não, Matrix nao é um "filme de luta".)

No serviço público, em algum ponto da nossa carreira, eventualmente somos apresentados a essas duas pílulas. A pílula vermelha pode vir em forma de um projeto interessante, inovador. Algo que demande trabalho, enfim. Viagens intermináveis, menos contato com a família e mais tempo para se dedicar à res publica. A este ponto, é chegada a hora de dizermos sim ou não a ela.

Quando dizemos sim à pílula vermelha, é como se tomássemos pé da realidade como ela é. Descobrimos que temos de trabalhar com prazos, metas, qualidade. O grau de eficiência esperado é semelhante e muitas vezes maior que o da iniciativa privada, com bem menos recursos, e com a agravante de que podemos responder administrativamente, e até mesmo judicialmente, por nossos erros, intencionais ou não. E se o projeto não sair? Ou se sair a um prazo e custo inviáveis? Na iniciativa privada isso é resolvido com uma canetada e um bilhete azul. Vão em paz, em busca de novos desafios. No serviço público, em vez disso, as coisas são resolvidas na temível Corregedoria. Não apenas podem perder o emprego os que pilotam mal suas naves; podem, da mesma forma, amargar cadeia.

Não podemos errar; a pílula vermelha não nos dá feriados, finais de semana. Ela nos dá um objetivo e um sonho. Objetivo de cumprir nossas tarefas a contento, e o sonho de, com isso, construir um serviço público e um País melhor.

E se tomarmos a pílula azul? Aí tudo bem. Exercemos nossas atividades das nove às dezoito, com tempo e pausa para o café. O salário, depositado religiosamente no mesmo dia de todo mês, nos dá a certeza de que trabalhamos em uma empresa que, como supomos, sempre existirá, e prosperará, a despeito do que fizermos ou deixarmos de fazer por ela. Servos inúteis, não fazemos mais que a obrigação, sem ter ideia do sofrimento dos que fazem muito mais do que ela. Nossa escolha, é sempre fazer nada, sendo "nada" definido como "o suficiente" para que tudo corra bem e que o indivíduo possa ir para casa pensando em nada além do jogo do Flamengo, ou do jantar com a esposa.

À semelhança do filme, no serviço público os "pílula azul", além de seres essencialmente dormentes, são potenciais opositores de tudo aquilo que os "pílula vermelha" vierem a fazer. Vistos como subversivos e anarquistas, freqüentemente os "pílula vermelha" são rechaçados pelos pílula azul, com o espírito reacionário, leviano e intrigueiro que os permeia. E é essa a luta, por um Serviço público Melhor. 

E mãos à obra. Há muito trabalho a fazer, Morpheus.

3 comentários :

Lygia disse...

Assim como na vida, cada um faz sua escolha de acordo com sua capacidade. Capacidade de entrega, de sonho, de trabalho... principalmente a capacidade de fazer a diferença e não ter medo de arriscar. Parabéns por mais um texto impecável.

Lygia

Luiza Helena disse...

Então, vamos por mãos a obra!
Que 2013 traga novos desafios para serem superados com saúde, amor e paz!
Saudações!

Renata Antero disse...

A comunicação é mesmo uma ferramenta incrível. A cada vez que é colocado um mesmo assunto a gente sente o acréscimo de novas informações. Dessa forma tão clara que se expôs, só aumentou minha percepção a respeito de todo o seu comprometimento com o trabalho. Parabéns por isso, pela sua inteligência e pelo seu texto.
Renata