quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Agricultura versus Falta de Cultura

Fabíola é da Agricultura. A descrição mais sucinta que posso fazer dela é: Um doce de pessoa. Cabelos longos, passando um pouco dos ombros, tez clara, sorriso sincero. Nem parece uma fiscal. Na sua paciência quase infinita com os viajantes, lembra mais uma professora, que com desmedido zelo, ensina aos apedeutas o beabá da saúde dos nossos pratos.

Todas as vezes que chego na Alfândega, Fabíola me cumprimenta com um caloroso abraço. Gosto muito da energia que ele traz, uma energia de paz, que parece contrabalançar meus próprios sentimentos, minha impetuosidade e meu instinto de guardião, de exército que sou.

Aqui na Alfândega do Fim do Mundo não nos preocupam apenas os valores tributáveis. Barreiras sanitárias e afins definem que espécie de alimentos podem ou não ingressar no país. Iguarias de origem animal, nem pensar. São pessoas como a Fabíola, que têm o discernimento para decidir que sorte de alimentos pode entrar no país, e o que deve ser retido e desnaturado.

A falta de conhecimento sobre a lei, por parte dos passantes, é regra nesse tipo de abordagem. De qualquer forma, as providências devem ser tomadas independentemente do fato de o viajante ter lido as letras miúdas ou não. As apreensões de alimentos são inevitáveis. O que não consigo desculpar mesmo, é a mais absoluta falta de cultura dessas hordas.

Vindas de uma classe média decadente, desaculturada, carente de valores, escuto as frases mais variadas e absurdas. A mais comum é:

- "Vocês vão é comer isso ! Essa moça é uma morta de fome, uma indigente! Vocês todos são !"

Autocontrole é a primeira palavra que me vem à mente. Não importa se estou olhando algum laptop ou passando sabão em algum espertinho que excedeu ligeiramente a cota - Meus pés, em fração de segundo, se posicionam a um palmo e meio da pessoa que proferiu o referido impropério. E lá estou eu, a passageira infame, e Fabíola, com um olhar de indignação.

- "Minha senhora, é o seguinte. Aqui a gente recebe o suficiente pra comer muito melhor do que esses queijinhos baratos que a senhora está trazendo aí. Mas para a senhora não ter dúvida, o pessoal da Agricultura joga creolina em tudo.

Mais uma piadinha infame dessas, e eu prendo a senhora por desacato."

Faz-se um silêncio na bancada. Sei que é ruim ameaçar recorrer à força, mas em toda minha vida, não consegui que a ignorância compreendesse outra linguagem. (Aceito sugestões nesse sentido). Fabíola sorri pra mim. Pergunto a ela se preciso acionar a polícia. Ela diz que não. O trabalho segue normalmante, a passageira não diz mais nada, tão somente me dirige olhares que solenemente ignoro.

Pessoas de classe dita "média alta" usam desse tipo de artifício, na esperança de serem consideradas, de alguma forma, superiores. A Alfândega é um dos poucos lugares em que esse tipo de gente tem que baixar a cabeça e ouvir. Isso só acontece, porque o que nos torna superiores não é o quanto temos na conta bancária, e sim entre nossas orelhas. A cultura é um item desprezado, esquecido dessas turbas. E nesses momentos de tensão, de fiscalização, faz muita falta. Devemos nós, à luz do conhecimento, resolver essas situações de conflito com maestria, demonstrando superioridade em inteligência, perspicácia. Isso é o que importa. Sem cometer excessos, respondendo sempre à altura dos comentários, de uma maneira que o ser fiscalizado possa entender, e quem sabe um dia, ser trazido de volta à Luz.

No fim do vôo, sorrimos uns para os outros, trocamos apertos de mão, abraços, energia. É missão cumprida em favor do conhecimento, da liberdade, da cidadania.

13 comentários :

Lila disse...

O fato da ignorância só entender a linguagem da força, pode explicar muito mais do que acontece no cotidiano... Pode, quem sabe, nos ajudar a entender a violência das guerras...

Lygia disse...

O que mais assusta é ver que os filhos dessa ignorância, cada vez mais se utilizam da linguagem da força. Triste ver uma criança zombar de um carinho, de um sorriso, fazendo girar o círculo da violência...

Fred Matos disse...

No íntimo não creio que um fiscal instruído e pacato precise usar da ameaça ao uso da força física, quando dispõe da força intelectual, da fina ironia, de outros recursos racionais. Exceto, penso aqui comigo, se o fiscal esteja emocionalmente envolvido. Começo a desconfiar que esteja apaixonado por Fabiola, pois somente a paixão – qualquer tipo de paixão – é capaz de mover à violência um homem bom.
Abração, meu amigo.

Bezinho disse...

Oi papito.
Hoje à noite,o assunto
vai ferver em seu endereço
no canto rural.Fica muito claro,
a desinteligencia humana e crescente
no dia-dia, não importando o seguimento da sociedade e seu status social,com certeza a inversão de valores nos traz essa decadência.
um beijo
te amamos
Angélica Amorim

Mari Amorim disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Fabi disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Felino da Madrugada disse...

No Brasil, atualmente, há uma questão mais premente a exigir resposta:
Afinal, o que provocou a inversão de costumes e valores no país: os setores político-governamentais influenciaram a nação, ou foi o procedimento do povo que contaminou as esferas mais elevadas do poder?
A questão, obviamente, não será aqui esclarecida. Não tenho a veleidade de me fantasiar de antropólogo, sociólogo, cientista social ou político. A eles cabe o encargo de desvendar o fenômeno.
O certo, no entanto, é que até o mais descuidado, o mais desatento pode observar que, nos últimos anos, o comportamento do brasileiro de um modo geral passou por uma metamorfose, no que se refere aos valores, aos conceitos e aos princípios que norteiam a vida na sociedade.
Admitem alguns que o povo de modo geral alterou o comportamento e passou a relegar regras de conduta, depois que assistiu, sistematicamente, nos últimos tempos, a derrocada total e absoluta dos procedimentos adotados pelos governantes, pelos políticos, pelos dirigentes do Estado brasileiro.
Desculpe me por postar um texto longo.obrigado pelo espaço.
ah,foi promovido a Papito?
tb quero kkkkkk
Abraços
Michel Amorimmic

Unknown disse...

Fred,
De uma certa forma, sou apaixonado sim por Fabíola enquanto profissional competente, dedicada. É uma paixão que sinto pela sua forma de trabalhar, com energia e doçura. Paixões de qualquer espécie, mesmo as profissionais, sempre nos fazem tomar ações desmedidas.
Talvez seja o que me moveu a tentar prender a passageira que a agredia.
Aos demais, agradeço as mensagens e todo o carinho.
Abraços
Joeldo

Unknown disse...

Ah, Angel e Michel, antes que eu me esqueça, é impressão minha ou ganhei mais dois filhos virtuais?
Espero que a Lorena goste dos irmãozinhos... Ou seria zões? rs
Abraços !

Angelica Amorim disse...

ah Papito (zões)
e com certeza pra valer rsrsrs
a Lorena? vai A D O R A R !
vou doar todos os meus gloss,presilhas,papeis de cartas,
pelúcias,e mais ,vou convida la a participar do nosso projeto "Cheiro de mato",horta,bichos e uma amiga da amoreira, a jaboticabeira,que ja encomendamos,eu e o Felinokkk, estamos construindo balanços com pneus, ela não vai gostar?, ela vai amar!
ah!hj tô online
bejajajão
Angelica Amorim

cantinho da Tania disse...

SOU CURIOSA..!!! NÃO TEM PREÇO!!!! Sempre fico tempo visitando sua página,Analisando seu perfil..Te observei de várias maneiras,e cheguei a conclusão que: Você! Pessoa maravilhosa faz do amor sua constância nas trilhas de sua vida..Faz-se sempre persistente e forte em seu dia a dia..Não se importando e vencendo dores, angustias,desamores, momentos amargos, decepções, fraquezas,e muitas vezes injustiças pela quais passa...Mostrando sempre seu caráter verdadeiro e transparente..Sempre retribuindo com abraços fortes de carinho a quem cruza seu caminho...Transmitindo energia e sinceridade ao apertar-lhes as mãos..Faz dos tropeços seu trampolim para as vitórias..Qualidades poucas vezes observadas nos seres humanos Não pede retorno a sua maneira singela de sorrir, de querer sempre bem as pessoas que te rodeiam até mesmo aos que nem conhece... Quantas vezes se emociona com história de vida de seus amigos, Nunca esconde que chora junto com eles, apesar de simples mortal que é, sua opção pela honestidade, amor,Te diferencia dos demais,a faz ter uma visão mais ampla da vida.. É humilde e feliz em não reclamar até por aquilo que não conseguiu, e a olhar com agradecimento ao que teve como perca...Esse seu mérito em acreditar e ver que assim se vale a pena viver...Horas com fortes emoções, com verdades, com o coração voltado para o amor verdadeiro que deve perdurar sempre como bandeira do ser humano...Uma pessoa iluminada...Anjo do AMOR...Dádiva de DEUS...É assim que te vi, te vejo e sempre a verei,de uma amizade pura e verdadeira... Sempre me perguntam quanto eu pago pela sua amizade.Respondo sempre com convicção?Que não pago nada!!!Sabe por que?Você é um presente dado por DEUS!!!Presente que Deus nos dá não tem preço!Que voce seja ricamente abençoado... Que o brilho de sua estrela esteja sempre em plena ascensão.. Abraços no coração...

joeldo disse...

Que este mero funcionário de Alfândega possa ser tudo isso que diz, Tânia.
Obrigado pela amizade e pelo carinho.
Abraços
Joeldo

Bezinho disse...

Olá papito...
estou tentando entender inultimente,
pq a flor Dama de Ferro derrama lágrimas sucessivas sobre o cheiro de mato,ao ser tocada por um vento longíquo mas arrasante?,pobre vento
não sabe o valor dessa flor...